A ignorância da aparência

Fui convidado pelo Atelier Pau D'arco para participar da abertura ao público e exibir as ferramentas da antiga São Paulo Railway no final de semana de 29 e 30 de julho de 2023 durante o Festival de Inverno de Paranapiacaba e confraternizar com meus amigos artistas e artesãos. Foram dias bem agradáveis ao lado de Regina, Sérgio e Claudio. Recebemos a visita também de Roberto também grande amigo. Fizemos uma visita a artesã Rosana que mostrou com muito orgulho seu forno para cerâmica, Roberto aproveitou para dar umas dicas sobre a resistência elétrica que ela usa para "queimar" seu material. A dúvida da Rosana era se havia possibilidade do forno alcançar a temperatura de 1.200ºC com a resistência de alumínio niquel cromo e Roberto grande especialista nesse tipo de material deu todas as dicas, uma aula.





Ferramentas antigas da São Paulo Railway usadas para manutenção dos trens e trilhos

Durante a visita ao Atelier Pau D'arco aproveitei para levar o conhecimento da construção da Poltrona De Stijl aos artesãos e foi uma experiência muito interessante, mostrar a leitura do projeto, um projeto relativamente simples e conseguimos construir com os materiais que haviam no local sem muito esforço. O artesão Sergio ficou muito empolgado com a construção da poltrona que é um símbolo da arte moderna e do movimento artística De Stijl.

Poltrona De Stijl, conhecimento levado para os residentes Sérgio e Regina do Atelier

O tempo não estava lá essas coisas, no primeiro dia muita chuva e frio, o que era pra se esperar do inverno, afinal o público foi lá pra sentir frio. De todo modo a exposição rolou e muita reflexão sobre a construção da Vila de Paranapiacaba também, ao longo do tempo aproveitamos para defumar carnes e conversar sobre a exposição e o tema cunhado, um tanto polêmico, afetou muito os residentes, mas que retratava a degeneração da ideia aparente de um socialismo as avesas, um socialismo aparente, um socialismo utópico.


Para manutenção do aquecimento nada como cozinhar ao fogo

Houve um tempo em que se pensava um futuro melhor para o mundo e para o Brasil, em que a confiança de uma nova era econômica pudesse ser conquistada com resultados socialmente ajustados em plena ascenção dos monopólios no ocidente e final da escravidão no Brasil, uma época em que se passou pela cabeça de poderosos a possibilidade de haver crescimento econômico sem miséria, porém, como uma casa construída em areia movediça, essa visão foi desbancada pelo socialismo científico. Não era só construir vilas comunitária própria a vida com dignidade, a justiça que provêm da aparência sempre falha e o ideal progressista de Barão de Mauá, que aforriava escravos por onde passava e pagava salários aos trabalhadores e que também era "bem chegado" dos grandes industriais ingleses e do socialismo inglês, nutriam uma esperança do sucesso do capitalismo no século XIX e XX, logo se viu a conta do crédito para o mundo moderno "cheio de justiça" chegar e surrupiar o fio de esperança que esses poderosos tinham no sucesso do Brasil virar uma super potência moderna.


Fachada do Atelier Arte Pau D'arco em Paranapiacaba, Santo André, SP

O socialismo utópico inglês dessa gente poderosa do século XIX apenas tinha eficácia momentânea, aparente, e não prosperou, uma tentativa desesperada para sanar a miséria retratada pelo industrial prussiano radicado na Inglaterra, Friedrich Engels no célebre "Die Lage der Arbeitenden Klasse in England" (A situação da classe trabalhadora na Inglaterra).

"A condição da classe trabalhadora é a base real e o ponto de partida de todos os movimentos sociais da atualidade, porque é o ponto mais alto e mais evidente da miséria social existente nos nossos dias. O comunista da classe trabalhadora alemã e francesa é seu produto direto; o fourierismo e o socialismo inglês, assim como o comunismo da burguesia educada alemã, são seus produtos indiretos. Um conhecimento das condições do proletariado é absolutamente necessário para permitir uma base sólida para as teorias socialistas, de um lado, e pelos julgamentos sobre seu direito de existir, por outro; e para colocar um fim em todos os sonhos sentimentais e fantasias pro e contra." (Engels, 1844)

A Vila de Paranapiacaba é uma "ilha da fantasia", uma obra de engenharia civil para afogar as mágoas do peso na consciência de uma parte da classe burguesa que via o mundo novamente instalar um novo tipo de miséria, um novo tipo de escravidão. A miséria não deixa de se instalar pela arquitetura ou por qualquer outra forma de beleza exterior. Paranapiacaba é uma experiência humanista que degenerou ao longo do tempo, talvez porque nada foi feito ou porque foi muito pouco compreendida pelo conjunto da sociedade brasileira. Talvez ainda pela ambição egoísta de barões que vislimbravam o êxito da nova era moderna que nascia a duras penas pela máquina a vapor, mas que não sobreviveu não só pelo boicote mas também pelas crises cíclicas do capitalismo e pela guerra do Paraguai que veio em seguida determinando o real interesse do domínio imperial Inglês. O mercado, o clube, o cinema, o saneamento básico, a arquitetura panótica, nada tem valor sem uma referência genuinamente de senso comunitário, a utopia de algumas pessoas de poder nunca foram a real necessidade coletiva da classe trabalhadora. 

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