As descrições da sociedade intelectual sobre a miséria

A compreenção da agricultura passa por entender, estudar e praticar com aquilo que muitas vezes não se vê, ou se vê só o resultado dos processos naturais, muitas vezes incompreendidos e mal interpretados. Isso também acontece no mundo da sociedade, muitos dos processos e movimentos da sociedade são invisíveis, isso me faz pensar que tanto na agricultura quanto na sociedade é preciso descobrir e pra isso o sujeito que tenta compreender tais objetos precisa de instrumental adequado para esse trabalho e a agroecologia é um instrumento, a academia detêm esses instrumentais, porém não só de um arsenal instrumental resolve, sendo que pensar ainda é o melhor de todos os instrumentos.

A abordagem arrojada e em construção permanente da agroecologia, atrela o desenvolvimento metodológico ligado as ciências naturais as ciências humanas, isso porque a natureza dá suporte a prática da agricultura e, fundamentalmente, dá suporte a realidade material do movimento da sociedade que impulsiona suas relações em constante transformação. São ciências que se integram, porém, com identidades diametralmente opostas.

Obra de Gontran Guannaes Netto na estação Marechal Deodoro do metro de São Paulo sobre os trabalhadores rurais

A força de vontade de erradicar a miséria por meio da agricultura discutidas pela sociedade a margem esquerda das classes médias, abastadas e acadêmicas intelectualizadas permite a instalação de contradições entre seus modos de vida ao movimento real do trabalhador agricultor e artesão. A força de vontade misturada a aventura transdisciplinar dessa sociedade entre as ciências naturais e as ciências humanas não traz necessariamente eficiência nesse justo combate.

O levantamento das demandas pelas "lideranças" acadêmicas sobre as massas pauperizadas e o trabalho desvalorizado da agricultura implica o aprofundamento de uma crise desnecessária, porque a vida daqueles que levantam as demandas dos pobres não é explicita, a vida complexa da intelectualidade não é levada em consideração nas infindáveis reuniões. O "olhar sociológico" transdisciplinar sobre a miséria, sobre a falta de políticas, sobre as deficiências no conhecimento da agricultura e fundamentalmente sobre a falta de infraestrutura, ou ainda a publicação da miséria via artigos e "papers" demonstra o desvio liberal da esquerda polida e intelectualizada. 

Publicar a miséria em artigos e documentos acadêmicos já é uma prática saturada, essas descrições da realidade estão por toda parte, lendo essas descrições, me parece óbvio que o processo metodológico acadêmico está degenerado, porque não sai da aparência, acentua e cria crises de liderança, coletivismo fortuito e, pior, a abstenção política. Esse olhar distante da academia que ensaia sua participação no movimento social por meio do pretenso encaminhamento de soluções por via políticas públicas, ou trocando em miúdos, assistencialista, tem um objetivo inconsciente de manter-se níveis de "castas" bem estabelecidos entre quem cuida da distribuição e da produção.

Me perplexa a burocracia acadêmica, que faz da investigação científica uma salada mistificadora e que apenas faz descrições e que não reproduz aquilo que já se sabe, ou precisa saber mais ainda sobre a miséria brasileira? O arcabouço da miséria já é sabida, tanto pela massa quanto pelos intelectuais, a história já está posta, mas mesmo se sabendo de tudo que é necessário para a prosperidade da agricultura, ou agroecologia, a abstenção política acadêmica impede a abnegação e a aparência altruísta da academia continuará favorecendo a dinâmica do "eu te cito, tu me citas e nós nos citamos" fazendo da miséria um adorno intelectual. Mas mesmo assim, o levantamento de dados por parte da academia sobre a miséria passa por um sutil utilitarismo, e com afagos e segundas intenções, põe-se o povo esperançoso a falar sobre suas condições e ainda os põe a decidir sobre o seu próprio futuro sem qualquer perspectiva de como fazer e por onde seguir.

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